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Faro, Pará, Brasil

“Tu tens muitos passados, uns alegres, outros tristes

Vivestes muitos anos solitário no abandono

Os teus filhos aqui sofrendo as grandes necessidades

Pedindo a São João Batista por obra de caridade.”

(AZEVEDO, Francisco Melo de. 2004)

         O trecho acima foi retirado do poema de Francisco Melo de Azevedo, conhecido na cidade de Faro como Seu Palito. Os versos foram escritos na ocasião do bicentenário da cidade, comemorado, de acordo com o escritor, com a participação de importantes políticos e pessoas da localidade, da região e até do Brasil inteiro. Seu Palito relata, no poema, importantes elementos que constituem a idade de Faro, sua história e sua vida: as alegrias e tristezas, a sensação de abandono ou esquecimento – dadas as distâncias e isolamento em relação à capital do Estado – e mesmo a rica relação com o padroeiro da cidade, São João Batista, maior homenageado das festas juninas e muito bem representado, também, no Festival de Quadrilhas.

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Foto: Malenna Clier

      A cidade tem origem na aldeia dos índios Jamundás,  missionada pelos Capuchos da Piedade.  A localização da aldeia estava abaixo do rio Paracatu com Jacundá, mas, por dificuldades de se estabelecer no local, os padres transferiram a missão para a margem do lago,  dando a ele a proteção de São João Batista. A criação do município tem sido atribuída à Fernando da Costa de Ataíde Teive, por ato de 21 de dezembro de 1768, e instalação no dia 27 do mesmo mês.

       Mesmo com a criação formal do município, em 1768, ou considerando a anterior ocupação da aldeia, missionada pelos Capuchos, os habitantes de Faro alongam a história da cidade para os relatos de Francisco de Orellana, explorador que navegou o rio Amazonas no século XVI e, no percurso, lutou contra indígenas liderados por mulheres, próximo ao Espelho da Lua. Orellana associou as guerreiras à lenda europeia das amazonas, conhecidas pela região como icamiabas. Para os habitantes de Faro, há uma relação que se estende desde à lendária ocupação das icamiabas até os dias atuais.

        Em 1830, Faro recebeu violentos ataques cabanos.  Em 1836, a câmara da cidade reconheceu a autoridade do presidente do movimento da cabanagem, Eduardo Angelim. A presença cabana, do século XIX, ainda se manifesta na memória da população local, sobretudo nas histórias de tesouros cabanos, enterrados e protegidos por espíritos, tesouros esses prontos para darem riqueza, mas também lições de moral sobre avareza, ganância e coragem.

        No decorrer desses mais de 250 anos da cidade,  ela passou por diversas mudanças, em constante relação política e cultural com as cidades e ocupações vizinhas, tanto no Pará quanto no estado do Amazonas, vivendo amplas trocas com cidades como Parintins, Nhamundá, Terra Santa, Juriti, entre tantas outras. A história de Faro, o íntimo contato entre indígenas e não indígenas, a relação com os santos católicos, e o caráter de fronteira são apenas alguns elementos que, sucintamente citados aqui, chamam a atenção para a riqueza e diversidade das manifestações culturais da cidade.

      Como manifestações culturais, Faro deslumbra de festas em transformações que, sua posição de “fronteira” permite experienciar. As festas, por sua vez, são um elemento importante para a movimentação econômica do lugar, bem como fundamentam as trocas culturais vivenciadas na região. Nas festas que ocorrem em Faro, é comum, desde muito tempo, moradores de outras localidades urbanas, rurais e ribeirinhas visitarem a cidade, pois é a oportunidade de reencontro entre parentes e amigos.

       Há dois períodos em que esta visita turística se intensifica, e podemos dizer, são períodos que acompanham o calendário natural de uma região de terra firme: o inverno amazônico, ou “cheia” – quando as águas do Nhamundá se aproximam do assentamento, por vezes até adentram as ruas e casas da frente da cidade – e o verão, ou “seca” – quando o rio se afasta e deixa surgir, para a alegria da população e de turistas, as belas praias em frente à cidade e rio Nhamundá acima. As duas festas que acompanham esse período, portanto, são a festa do padroeiro São João Batista e o aniversário da cidade.

         Podemos considerar que o calendário da cidade começa com a comemoração do seu aniversário que, em 27 de dezembro de todo ano, desenvolve programações com apresentações de shows de artistas e bandas locais e convidados de outras cidades, na praia. A programação dura o dia todo e conta com atividades de competição como torneios de pênaltis e vôlei, que se realizam na praia em frente à prefeitura; nas ruas da cidade ocorre a corrida de pedestres, nas modalidades feminina e masculina; no rio Nhamundá, a corrida de rabeta e competição de natação; e em frente à cidade, a corrida de cavalos. Por ser fundamental para a população, tanto em termos econômicos como das trocas pessoais, essa programação de aniversário pode acontecer desde o dia 26, com a armação de barracas de vendas na praia e shows culturais.

         A festa do padroeiro São João Batista, que ocorre entre os dias 14 e 24 de junho, atrai diversos romeiros e promesseiros ao Santo, que chegam antes mesmo do dia 14, quando se realiza o Círio fluvial. Já nas primeiras semanas do mês de junho, os barraqueiros constroem suas barracas ao redor da praça da Matriz, de madeira e instalações elétricas para suportar o abastecimento de suas vendas de bebidas e comidas. Do alto do centro da praça estendem-se bandeirinhas coloridas em fileiras, até os postes nas esquinas da praça. Um verdadeiro ambiente de festa, devoção e diversão.

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Foto: Zilton Fioravante

         Além da festa do padroeiro, uma festa religiosa e de importância econômica e identitária para o povo farense – é nesta festa que a história das quadrilhas folclóricas começa – há as festas de menores proporções, também ligadas à religiosidade e às trocas de bens pessoais. São as festas de mastro e ladainhas, nas quais famílias se reúnem para rezar a ladainha ao santo(a) e distribuir alimentos como café da manhã e almoço. Geralmente, a distribuição desses alimentos fica por conta da família promesseira. Ainda, há as festividades religiosas dos padroeiros de cada bairro, que são realizadas ao longo do ano.

 

          Entretanto, mesmo que as festas católicas de Santos apareçam com grande destaque para a cidade, não significa dizer que não existem outros tipos de crenças. Há o cristianismo na forma católica e pentecostal, e há as crenças e práticas de curas realizadas por benzedores, curandeiros e puxadores, herança dos povos originários. Estes, homens e mulheres, participam de um circuito de conhecimentos e práticas difundidos nos saberes populares, na procura diária, seja para puxar um osso desmentido, ou para preparar um remédio caseiro para espantar um mau-olhado ou “quebrante”. Não obstante, Faro é reconhecida nas localidades próximas, com as quais constrói laços afetivos e econômicos, como “terra da macumba”. A fama, no entanto, ora equivocadamente tida como pejorativa, ora reforçada para fins de persuasão, traduz aquilo que Faro foi um dia: a morada de grandes figuras curandeiras da região (AZEVEDO, 2004).

 

         Como expressão do crescimento turístico na região, a cidade já apresenta equipamentos como hotéis, pousadas, transportes de aluguel, seja para desfrutar as praias, banhos e igarapés da região da estrada (PA-254) ou da região de rios (Rio Nhamundá e Paracatu), além de contar com um porto hidroviário de porte relativamente grande, recente no município, justamente para acomodar as grandes embarcações. Encontramos também os serviços de restaurantes, bares, comércios, bancos, hospital e escolas públicas.

       Ainda, Faro possui forte organização em torno do esporte, com times de futebol, futsal e vôlei, que competem entre si através de torneios locais, participando também de circuitos regionais. Os times – femininos e masculinos – participam de torneios de escalas menores como é a Copa União, ou em escala que envolve maior número de times, como a Copa Alvorada, que acontece em Parintins (AM).

 

         Como pontos turísticos, há as praias em frente à cidade, como a Fragata, Jauari; com acesso fluvial a do Juruá Estrada e a lendária Serra do Espelho da Lua; e com acesso terrestre e fluvial, a do Marco Velho, dentre outros igarapés e balneários com acesso pela estrada PA-254.

REFERÊNCIAS

FUNDAÇÃO AMAZÔNIA DE AMPARO A ESTUDOS E PESQUISA (FAPESPA). Estatísticas Municipais Paraenses: Fato. Belém, 2016.

AZEVEDO, Francisco Melo de. Lendas e Contos de Faro. Manaus: Espelho da Lua, 2004.

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